Alface, tomate e cebola?

É claro que era para ser temporário, afinal não é o emprego dos sonhos. Mas pagava suas contas e lhe deixava com tempo o bastante para manter todos os episódios de série em dia, então foi adiando sua saída, mesmo que sentisse vergonha todas as vezes que encontrava um conhecido na rua e este lhe perguntava o que ela andava fazendo da vida. Se bem que, vergonha mesmo, ela sentia quando se olhava no espelho e via aquela toquinha miúda prendendo seus cabelos em um coque no alto da cabeça.

Aquele era o trigésimo sanduíche que preparava em menos de duas horas de serviço, ou talvez o trigésimo segundo, perdera a conta depois que um cara a obrigou a refazer todo o seu lanche, só porque ela confundiu os frascos e deu um esguicho de maionese em cima de seu frango. “Temperada, eu pedi maionese temperada!”. Ela não tinha culpa se todos aqueles movimentos repetitivos já haviam se tornado automáticos e suas mãos trabalhavam sozinhas, às vezes realmente sem comando algum de seu cérebro.

Despertou de seus pensamentos assim que o viu parado na fila. De repente estava extremamente consciente dos ingredientes em sua mão, seu uniforme surrado e do suor que se acumulava em sua testa. Ele olhava para cima, distraidamente, escolhendo seu lanche no painel que exibia o cardápio com as ofertas do dia. Não via Christian desde os tempos de colégio, mas nunca se esquecera do formato quadradinho e másculo de seu queixo perfeito.

Levou a mão até a cabeça, desejando poder tirar aquela touca, mas sabia que seu cabelo amassado lá dentro não lhe conferiria um melhor estado. Trocou de lado com Lilian, ficando responsável pelos vegetais e empurrando a colega para o setor de recheios, adiando assim seu inevitável encontro com o ex-namorado. E quem sabe, com um pouco de sorte, um buraco não se abriria no chão e a sugaria, poupando-lhe do constrangimento que estava prestes a acontecer.

Mas, três lanches depois, ali estava ele, pedindo um lanche de salame com pepperoni, com sua voz rouca, e sexy. Ela sentia a pele de suas bochechas ardendo, e não era pelo calor do forno. Lilian levou a bandeja com seu lanche até lá e ela se virou, apoiando a mão no puxador engordurado e tentando se concentrar em contar os segundos que o aparelho levava para aquecer e derreter a porção extra de queijo suíço.

Pouco depois, com as mãos trêmulas carregando o sanduíche, colocou-o no balcão entre eles e finalmente o encarou, dizendo a primeira coisa que lhe veio à mente: “alface, tomate e cebola?”. Ele apenas concordou com um aceno, olhando distraidamente para os ingredientes. “E picles, por favor”. Completou seu pedido com uma farta dose de molho parmesão e embrulhou o lanche, ainda sem acreditar.

“Obrigado”, disse, olhando em seus olhos, ainda sem reconhecê-la, e seguiu para o caixa, no final do balcão que os separava. “Por nada, Christian”, suas palavras ecoaram pelo salão antes que ela pudesse controlá-las, e obrigando-a a fechar os olhos para não ver sua expressão quando ele se virou.

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