Me sinto sem lugar. Venho novamente despejar-me sobre o papel, numa tentativa de me organizar em palavras. Me faço, desfaço, refaço. Se me sinto frustrada em ter um trabalho que não gosto e, talvez até mais incomodada nos dias em que fico em casa, é porque não me sinto pertencente a lugar algum. Perdida, sem guia, GPS ou respostas, não sei qual caminho percorrer para me encontrar. Atalhos, nem pensar.
De repente fiquei nula, como se neste momento não só minha vontade não valesse, mas sequer eu devesse desejar algo. Não há espaço, tempo ou energia para investir nisso. Por quê? Tenho medo de me deparar com o esvaziamento de mim ou é uma vã tentativa de evitar a decepção de novamente ver meus planos adiados?
Estou operando em um modo de emergência há tantos meses que perdi a noção do tempo. Trabalhando igual a um verdadeiro bombeiro, esqueci como é ter paz. Feito uma roda, ando e me atropelo, passando dolorosamente por cima de mim todos os dias.
Ontem, em meio a um jantar casual, ouvi que era preciso ter calma, essa é só uma fase, vai acabar. Uma hora acaba, tem que acabar. À queima roupa, foi-me dito que hoje faço a manutenção do caos. Por mais que essas palavras tenham ferido, sei que não podiam ser mais precisas. Porque eu sei que a pior parte já passou e, apesar de ainda sentir o peso do mundo em minhas costas e de inúmeras caixas em minhas mãos, já passou muito tempo do dia em que abaixei as portas e me recolhi.
É claro que me orgulho de minha história e que esse fragmento virou parte essencial de mim, como a linha que costura os retalhos de uma colcha. Mas, ainda retalhada, sinto-me incapaz de expressar ou usufruir de meu aprendizado. Todos dizem que mudei, amadureci, que sou forte! Ah, se soubessem como minhas pernas estão cansadas de tanto caminhar.
Hoje, com tudo reacomodado em outro canto, em outra posição, de outro ângulo, a vida se refaz. E, por mais que doa admitir, eu sei que estou exatamente no lugar em que preciso estar nesse momento. Espero que um dia haja lugar para mim que não este, e que eu possa mais uma vez me refazer.