Cinza

Escrevo numa folha em branco, o céu está azul lá fora, mas o dia é cinza. Não sei bem como aconteceu, mas, quando me dei conta, já fora tomada por esta sensação vazia e desbotada.

O mundo, que sempre fora colorido, ficou opaco. Eu me orgulhava de perceber os tons e nuances que me cercavam, e logo entendi que não podia escolher um único tom para mim, pois somos constituídos por nossas tonalidades afetivas, as emoções se expressam nos estados de ânimo e somos sempre tocados afetivamente de alguma forma a cada momento. Então aprendi a variar, em um balanço constante: dias bons, dias ruins.

Mas, de repente, tudo parou e me vi desesperançosa com a vida e com o mundo. É difícil admitir que sofro. Eu sei que as coisas que vivo me afetam, mas, ainda assim, foi tão ruim me sentir atingida naquele momento, logo naquele dia que deveria ser especial. Então tentei fazer com que o sentimento passasse logo. “Ok, já sofri e aprendi a lição. Agora chega! O que vem a seguir? ”. Mas nada veio em sequência e eu me vi sem saber de superar o que sentia.

No dia seguinte, continuei incapaz de sentir qualquer coisa e, aos poucos, o embotamento foi tomando conta de mim. Acho que relutei tanto em admitir que não estava bem, que não me permiti ficar triste, porém, ao não sentir a tristeza, eu também não senti mais nada, absolutamente nada. Descobri que para recuperar um pouco de cor em minha vida, eu precisaria primeiro lidar com o que vinha evitando. Acontece que a dor precisa ser sentida. Quando percebi isso, fui invadida por um aperto no peito e então tudo ficou ainda mais escuro. Deixei o cinza para trás e voltei a sentir em diferentes intensidades, bem difíceis, por sinal.

Chego ao fim da folha me sentindo grata por conseguir colorir a página com minhas palavras tristes. Pelo menos agora sinto que as coloquei para fora. Ainda não posso dizer que estou bem, mas já percebo algumas cores se insinuando à minha volta, e sei que em algum momento elas voltarão, quando eu menos esperar.