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Cabelos coloridos

Sempre fui aquela adolescente estranha. Hoje, olho para trás e penso “mas qual adolescente não é estranho, não é mesmo?”. Mas na época não tinha tal clareza, e sentia que o problema era exclusivamente meu.
Pensava ser a única insatisfeita com o meu corpo, descontente com minhas espinhas e com a pele oleosa, me sentia meio de fora do que acontecia no mundo. Via os colegas de sala bem enturmados, e todos pareciam tão bem. Era como se eu fosse a única que não tinha muitos amigos, que não sabia me aproximar das pessoas, que ainda não tinha beijado ninguém (apesar de ter uma quedinha secreta por um garoto).

Enfrentava algumas batalhas pessoais em casa: meus pais se divorciando e mantendo uma sociedade. Se divorciaram por brigarem tanto, pois bem, as brigas triplicaram. E eu me sentia sufocada por não ter com quem conversar a respeito. Vestia meu sorriso (de aparelho) e ia para a escola. Sempre encontrei companhia nos livros, enquanto lia, sentia que deixava meu mundo para trás e, durante algumas horas, pertencia a outra realidade, outra história, e isto, em geral, me confortava, mas não durava muito e eu precisava voltar à minha própria companhia.

Uma das coisas que mais me incomodava era o meu cabelo. Tive inúmeras crises por ele e com ele. Era liso, mas aos doze anos começou a cachear e eu nunca aceitei os meus cachos. Me achava muito diferente das outras meninas, já que, ao meu ver, todas pareciam ter cabelos lisos e sedosos. Eu não sabia cuidar dele, então ficava armado e, bem, era horrível. Resolvi alisar. E eu usava uma franjinha – porque minha mãe adorava franja – ou então deixava ela crescer e dividia tudo ao meio, ficava aquela coisa escorrida e grudada na cara, mas jogar o cabelo para o lado e chamar atenção não eram possibilidades para mim. Não posso dizer que me arrependo, gosto dele assim, mas é triste pensar que depois de tantos anos eu já nem sei mais como é o meu cabelo natural.

Tentei de tudo: fiz mechas, colori, fui do vermelho ao roxo. Parece que eu tentava me expressar por meio do cabelo. E tinha o maior orgulho dos meus cabelos coloridos. Até que entrei na faculdade e parei de ter tempo para pintá-los a cada quinze dias. Deixei a franja crescer, pois ela também dava trabalho, e aos poucos fui arriscando uma jogadinha para o lado, e mantendo sempre um grampinho por perto para prender e impedir que o cabelo caísse todo no meu rosto e grudasse no batom.

Mas junto com todo este colorido me veio a maturidade e eu nem percebi. Quando me dei conta eu já tinha beijado alguém (não, não foi aquele menino), já tinha feito outros amigos, e tinha até decidido o que estudar. E aos poucos notei que é normal se sentir desajustado na adolescência e até mesmo não se reconhecer, afinal é uma fase marcada pelas transições. E não, as outras meninas não tinhas cabelos lisos e sedosos, todos tinham espinhas e dava para ver meu reflexo em algumas testas oleosas, mas como eu não me reconhecia, não notei.

Ainda tenho algumas espinhas e tem dias que não consigo arrumar meu cabelo, mas isto já não me incomoda tanto assim. Apenas o prendo para que não caia no rosto enquanto penso em minhas crises atuais. Acho que o mais importante foi me dar conta de que toda crise, por pior que possa parecer, passa. Às vezes nos dá um pouco de tranquilidade, outras vezes já é logo substituída. E são elas que me movimentam.

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