Aqui em casa nós sempre deixamos a televisão ligada. Mamãe passa muito tempo no sofá, então acompanha uma série de programas ao longo do dia, e SEMPRE tem algo passando.
Já estamos acostumados com o constante barulho de fundo, portanto, é de lei jantarmos ao som do jornal da noite ou da novela que estiver no ar naquele horário. É ótimo para quando não queremos conversar ou quando não encontramos um assunto que agrade a todos, pois é só fazer algum comentário sobre os acontecimentos do dia ou sobre o cabelo de alguma atriz.
Na terça-feira, cheguei em casa e encontrei um ambiente silencioso, atípico para o horário e para a família. Eu até conseguia escutar o barulho da secadora ao fundo, funcionando na lavanderia. Naquela noite jantamos em silêncio, e eu não tive coragem de perguntar o motivo.
Na manhã seguinte, na hora do café, estava sozinha à mesa e peguei o controle remoto automaticamente para ligar o aparelho e assistir ao jornal matutino. Passeei com os dedos pelos botões em busca de uma programação que me agradasse, porém nenhuma das opções me satisfez. Então experimentei fazer aquilo de novo, desliguei a tv e tomei café da manhã em silêncio, ouvindo apenas o som de minha própria mastigação.
Pouco depois, mamãe entrou na cozinha e, enquanto me cumprimentava, pegou o controle e religou o aparelho. O som ficou alto novamente e me senti incomodada com tanto barulho.
Deixei a mesa, com minha tigela de cereais, e fui terminar de comer na sala, sem ser incomodada por uma voz desconhecida. Mas, imagine o tamanho de minha surpresa ao começar a ouvir uma outra voz, essa vinha lá de dentro, começando bem baixinha e suave, aumentando gradativamente.
Olhei para o móvel que concentrava uma coleção de porta-retratos com fotos de toda a família, comecei a contar quantas vezes eu aparecia ali. Fui me demorando em cada foto, olhando atentamente e tentando lembrar dos detalhes de cada um daqueles momentos.
Foi então que o vi ao meu lado, na foto do casamento da Lívia. Naquela época ainda estávamos namorando e ele saiu na foto, condenando a lembrança da família para sempre com mais um de meus fracassos amorosos. A voz, foi ela quem veio com essa última frase. Comecei a ficar incomodada com seus comentários impertinentes. Ali, ela apontou, ele também estava na foto das últimas férias na praia, eu sabia que aquela era sua mão, em minha cintura, apesar de mamãe ter dobrado a foto dentro da moldura.
“Cadê o controle? ”, pensei. Alcancei-o rapidamente e acabei com aquele tormento.